Bem vindos

O crescimento da Associação Orquidófila Piracicabana - ORQUIPIRA foi a mola propulsora para a criação deste canal de comunicação, já que realizamos inúmeras atividades e nem sempre a divulgação dos eventos era feita de modo adequado. Utilize este espaço para sugerir, opinar, criticar, divulgar eventos relacionados a orquidofilia. Queremos fazer deste blog uma ferramenta importante para cada aficcionado pelas orquídeas.

Saudações orquidófilas

Robinson Viegas dos Reis
Presidente da ORQUIPIRA

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Uma flor de pessoa

Transcrevo na íntegra, um artigo publicado no jornal O ESTADO DE SÃO PAULO, em 14/12/2010, de autoria do agrônomo "Xico" Graziano, ex-Secretário do Meio Ambiente de São Paulo e contemporâneo na ESALQ do nosso Associado Fernando Olitta (que foi quem descobriu a matéria). O texto intitulado uma flor de pessoa, homenageia a Sra Ruth Cardoso, falecida em 24/06/2008, aos 77 anos e fala de seu amor pelas orquídeas e plantas em geral, além do registro de um híbrido de orquídea e da inauguração de um orquidário com o seu nome (vide também uma matéria neste blog sobre a inauguração do orquidário):

"Muita gente confunde as orquídeas com parasitas.Mas não tem nada que ver. As parasitas vivem à custa de seus hospedeiros, neles introduzindo suas raízes para lhes sugar a seiva. esse fenômeno, próprio das chamadas ervas más, não ocorre com as orquídeas. Elas simplesmente "moram" sobre as árvores.
Epífitas: assim se denomina botanicamente a sua situação.Embora existam espécies terrestres, normalmente as orquídeas se apresentam longe do chão, estabelecendo uma associação sadia com as árvores, agarrando-se aos galhos com suas grossas raízes, sem prejudicar ninguém. Lá em cima, buscam luz sombreada e aproveitam-se da água e dos nutrientes que encontram nas cascas da parceira, cheias de materiais em decomposição, enriquecida com a poeira trazida pelos ventos. Vivem numa boa, sem atrapalhar ninguém.
As flores de orquídeas encantam a humanidade há milênios. Surgidas há 84 milhões de anos , as orquídeas espalharam-se pelo mundo, inexistindo apenas na Antártida. Dizem que Confúcio, o grande filósofo oriental, por elas se interessou, indicando que foram os Chineses os primeiros a destacá-las em sua cultura ornamental. Na Europa, os Gregos primeiro a admiraram, curiosamente denominando-a orchis, palavra que significa "testículos". Supõe-se a extranha denominação pela semelhança de uma espécie de orquídea, descrita na época por Teofrasto de Lesbos, como ostendando dois pequenos tubérculos subterrâneos. Acabou confundida, simbolicamente com a virilidade.
Colecionadores e aficcionados sempre zelaram pelas orquídeas de forma amadora, pouco comercial. Seu cultivo exige estufas adequadas, nas quais se busca reproduzir o microclima - umidade e luz - das matas onde se escondem. Outra razão é seu restrito florescimento, verificado apenas uma vez ao ano. Lindas e raras, assim sempre foram consideradas as orquídeas.
Há muitas décadas porém, essa história começou a mudar. Tudo se iniciou com a descoberta do processo de hibridação vegetal, por meio do qual se realiza, em laboratório, o cruzamento de duas espécies nativas de orquídeas, gerando um descendente inusitado. No Brasil, somente por volta de 1950 a técnica começou a ser pioneiramente aplicada por um médico mineiro, o Dr Alberto Carlos Pereira Jr, de Guaxupé.
Professor de biologia e apaixonado por essas maravilhosas flores, após anos de tentativas e erros promovendo a germinação das minúsculas sementinhas das orquídeas cruzadas no laboratório doméstico, onde aprimorava  sua docência em Biologia,  a hibridação ganhou seu lado comercial nos viveiros Rinaldi, destacado floricultor paulista de então. Quem testemunhou a história foi Tonico Pereira, seu filho jornalista.
O aprimoramento das variedades ganhou impulso decidido quando, mais tarde, os pesquisadores descobriram o uso da clonagem na reprodução das plantas. Isso foi fundamental  porque normalmente os híbridos são estéreis, ou seja, não se reproduzam sexualmente. Então, por meio da clonagem, consegue-se produzir milhares de idênticos descendentes da planta escolhida. Eles surgem a partir do meristema, ou gema de crescimento, aquela bolotinha que se observa na base dos bulbos das orquídeas. Dê uma olhada.
Estima-se que atualmente se cultivem 100 mil híbridos de orquídeas no mundo, inscritos obrigatoriamente na Royal Horticultural Society, em Londres. É para lá que acaba de ser enviada a solicitação do registro da Rhynchosophrocattleya Ruth Cardoso, uma deslumbrante orquídea desenvolvida pelo desembargador e orquidófilo Damásio de Jesus.
Com flores amarelas e um pequeno detalhe vermelho no labelo, a nova orquídea foi apresentada na inauguração do orquidário Ruth Cardoso, situado ali no Parque Villa Lobos, na capital Paulista. Obra dos arquitetos Décio Tozzi e André Graziano, o caprichado orquidário é único no mundo.
Única e especial também foi Ruth Vilaça Corrêa Leite, nascida em Araraquara, no interior de São Paulo, no início da primavera de 1930. O Brasil jamais se esquecerá da simpática primeira-dama que odiava bajulação, preferindo ostentar sapiência.
Antropóloga, professora universitária (na USP), sua trajetória de vida combinou ensino e pesquisa com liderança na sociedade civil. A defesa dos direitos das mulheres e dos jovens, o fortalecimento da democracia, a construção de uma ordem mundial mais justa foram os principais campos de atuação de Ruth Cardoso em prol do desenvolvimento e da paz social.
Durante o mandato presidencial de seu marido, Fernando Henrique Cardoso, Ruth fundou e presidiu o Conselho da Comunidade Solidária. A iniciativa mobilizou parcerias entre ONGs, universidades, empresas e governos para a construção e a difusão de programas sociais inovadores. Contra o clientelismo político, a favor da emancipação humana.
Intelectual famosa, jamais perdeu o jeito simples de viver. Gostava de cozinhar, adorava quitutes, colecionava vidraria, fazia amizades, adorava plantas e flores. Ruth Cardoso foi, realmente, exemplar.
Para ela escrevi um singelo poema, tristemente inspirado no dia de seu falecimento, quando me ocorreu homenageá-la sugerindo ao governo construir o orquidário que hoje leva seu nome, um local de exposição das mais belas flores que existem."
"Sobre sua lápide repousava uma enorme flor de Cattleya. Quem ali a colocou para espantar a tristeza da morte sabia de seu gosto pela vida. Meiga, singela, cultivava o hábito das pessoas simples do interior. Intelectual, professora, curtia a existência com graça e ternura, sempre acompanhada pelas flores, as orquídeas em especial. Era o que eu mais pensava naquele momento dolorido: Ruth Cardoso era uma flor de pessoa."

Um comentário:

Olitta disse...

Robinson, o Xico Graziano não foi da minha turma mas meu conteporaneo e talvez meu aluno na ESALQ. O seu artigo é muito bonito, muito bem escrito, sobre uma flor muito bonita e para uma pessoa mais bonita ainda.